segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Admito... eu senti inveja

Um dia eu estava na casa da minha irmã e nós ouvimos um bebê chorar em um apartamento vizinho. A mãe gritava com ele para que parasse de chorar e quanto mais ela gritava, mais aquele bebê chorava... Não posso dizer que estou certa ou que tenho razão, nem quero julgar ninguém mas com certeza eu agiria diferente... creio que o que aquele bebê mais precisava era de acolhimento, de segurança, amor, conforto... não importa se ele estava com dor, com fome, com xixi ou cocô... se ele tivesse o acolhimento necessário, qualquer outra coisa seria quase que secundário... e aquela mãe gritava... Aquilo me deu uma raiva e ao mesmo tempo uma inveja... porque ela estava com o bebê dela nos braços e eu não... Por que a vida permitia que ela tivesse o bebê dela e eu não tivesse o meu? Eu que queria tanto embalar, dar todo aquele amor que estava em meu coração, alimentar, trocar, banhar... Por que eu não??? E aí eu vejo mulheres dando mamadeira, complemento alimentar porque tem medo de sentir dor no bico, porque não querem amamentar e eu com esses peitões enormes, com um bico perfeito, que doeu cada milímetro que cresceu, e que ainda hoje depois de duas gestações interrompidas não voltaram ao seu tamanho normal... e eu olho para minhas auréolas e vejo que uma está maior que a outra e que meu corpo por pouco tempo que tenha sido, sentiu o poder de uma gestação e que ele não mais voltou a ser como era... e eu também não...
E aí vejo mães pela rua tratando seus filhos com indiferença, sem paciência para cuidar e educar, dando maus exemplos, parindo uma criança atrás da outra sem a menor condição... E eu aqui cheia de amor, me preparando há mais de 5 anos quando decidi parar de fumar, preocupada com os exemplos que vou dar, sabendo que tenho um marido que será um pai maravilhoso... e o meu bebê não está aqui...
Quantas vezes me questionei se isso era justo? Quantas vezes questionei o que eu tinha feito de errado para ter que suportar tanta dor? Quantas vezes senti inveja dessas mulheres e das minhas amigas... sim das minhas amigas... quantas vezes?
E você deve estar pensando: "que coisa feia, sentir e admitir que sente inveja". A inveja é ruim sim. Mas não é ruim para o outro, objeto do seu sentimento... A inveja só é ruim para quem sente... porque esse sentimento corrói, aumenta nossa dor, nos faz perder a fé, nos faz deixar de acreditar... Um único sentimento é capaz de trazer outros tantos, que nos fazem continuar vibrando em energias negativas e aí tudo vira uma bola de neve...

Não sei dizer se já não a sinto mais... creio que aprendi lidar com ela...

Hoje consigo sentir a felicidade das pessoas e das minhas amigas que me contam que estão grávidas, sem deixar que a minha inveja seja maior do que meus bons sentimentos... Porque eu sou só humana e por isso não posso negar aquilo que eu sinto, e eu sinto coisas boas e coisas ruins... nem tudo se divide entre somente luz ou somente trevas... todo mundo tem um pouco de cada dentro de si... o que nos define é o lado que escolhemos viver...

Eu só fiz uma escolha e não quero mais sentir inveja... e por não querer creio que consegui superá-la. Essa escolha eu faço todos os dias...

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Como escolhi sair da depressão

Depois do segundo aborto, cheguei em casa e me vi sem rumo, sem saída, sem amor... Por mais que eu tivesse as amigas mais incríveis do mundo que ficaram comigo o tempo todo, o marido mais companheiro e amoroso, as irmãs mais lindas... eu me sentia incompleta... chorar já não aliviava a dor e eu vi que se permitisse, entraria em depressão e não sei se eu teria forças para sair uma vez estando lá... mas enquanto eu tive consciência disso, fiz uma única escolha que mudou o rumo que eu estava tomando... Escolhi pela minha vida e pelo amor do meu companheiro e das pessoas que me amam...

A primeira providência foi procurar uma terapia... eu queria um psicólogo antroposófico, mas meu momento profissional não me permitia ter esse custo, então apelei para o plano de saúde, escolhi uma psicóloga perto da minha casa (assim eu não teria a desculpa de não ir) e lá fui eu... Mas só a terapia não bastava, eu precisava ocupar minha cabeça com coisas produtivas, mas de forma que eu não esquecesse o momento que eu estava passando... Como gosto de estudar e estava ultimamente estudando Antroposofia por minha conta, decidi procurar um grupo de estudos. Encontrei o grupo pelo facebook em uma página que trata do tema e ali, ainda em um primeiro contato me senti acolhida. Sei que não é coincidência, porque hoje consigo ter clareza do quanto o universo conspira a nosso favor quando realmente queremos algo. Encontrei um grupo humano, amoroso e profundamente acolhedor, com pessoas que com empatia compartilharam a minha dor... Estudar passou a ser um prazer, e estar com aquelas pessoas me fez um enorme bem...
Mas, ainda não era o suficiente... eu estava cheia de dor mas ao mesmo tempo cheia de amor... um amor que eu compartilhei com meus filhos... mas que não podia ficar aqui guardado no peito... Sou espírita e na casa que frequento busquei participar de um projeto como voluntária, ajudando famílias em situação de vulnerabilidade social. Eu sempre quis ser voluntária e sempre usei a desculpa do "não tenho tempo"... mas basta querer de verdade para podermos doar o nosso amor... pq não é o nosso tempo ou o nosso trabalho que doamos, é o nosso amor... e enquanto não sentimos esse amor, não podemos fazer o bem pelo próximo.

Com o meu coordenador do grupo de estudos, ainda participei de um seminário biográfico, onde tive a oportunidade de compartilhar a minha história de vida e a história de pessoas incríveis, guerreiras, vencedoras, humanas... E quando olhamos para nossa própria história e olhamos para a história do outro, com um olhar aberto e desprovido de julgamentos, a coisa muda... não sei dizer bem como é, mas daquele momento em diante, diversos sentimentos ruins que se acumularam naquele meu momento de dor, foram vividos e sentidos de uma maneira diferente. A minha história de vida me permitiu ver que eu não precisava ter medo ou vergonha da minha dor nem dos sentimentos que a acompanharam, como inveja, ansiedade, medo, fracasso... A minha história é linda, com luzes e sombras, cores e ausência de cores, forma e movimento... As minhas perdas me ensinaram muito a respeito de mim mesma, dos outros e da vida...
Mas, eu aprendi, vivi e senti tudo isso porque eu fiz essa escolha... e faço essa escolha todos os dias quando acordo... Assim como um alcoólatra ou um fumante em recuperação, que todos os dias precisam fazer a escolha por mais um dia limpo, eu faço a escolha por mais um dia vivido... e viver não significa não sentir dor, não sentir saudade... significa sentir tudo isso com amor, amor pela vida, amor por mim, amor pelos meus filhos perdidos, amor pelas pessoas que me amam... Escolho todos os dias me conectar com algo muito maior do que eu e com meu propósito de vida.

O que aprendi é que não podemos não sentir... esconder a dor não vai fazer com que ela passe... o luto precisa ser vivido e elaborado... e vivido sem vergonha, sem medo. Nós não conhecemos os nossos filhos, mas nós os sentimos, nós os vivemos e nós os amamos. Nossos filhos existiram sim e não importa o que a sociedade diga, nós fomos mães. E como mães sofremos a dor de perder os nossos filhos. Porque eles não precisam ter um corpo formado para que os amemos... Eles só precisam existir no nosso útero e no nosso coração.

Agora, que meu luto foi elaborado, faço aconselhamento genético com um geneticista me preparando para engravidar novamente. Meus exames ainda não estão todos prontos então comentarei sobre eles em um post futuro.