terça-feira, 4 de novembro de 2014

Como escolhi sair da depressão

Depois do segundo aborto, cheguei em casa e me vi sem rumo, sem saída, sem amor... Por mais que eu tivesse as amigas mais incríveis do mundo que ficaram comigo o tempo todo, o marido mais companheiro e amoroso, as irmãs mais lindas... eu me sentia incompleta... chorar já não aliviava a dor e eu vi que se permitisse, entraria em depressão e não sei se eu teria forças para sair uma vez estando lá... mas enquanto eu tive consciência disso, fiz uma única escolha que mudou o rumo que eu estava tomando... Escolhi pela minha vida e pelo amor do meu companheiro e das pessoas que me amam...

A primeira providência foi procurar uma terapia... eu queria um psicólogo antroposófico, mas meu momento profissional não me permitia ter esse custo, então apelei para o plano de saúde, escolhi uma psicóloga perto da minha casa (assim eu não teria a desculpa de não ir) e lá fui eu... Mas só a terapia não bastava, eu precisava ocupar minha cabeça com coisas produtivas, mas de forma que eu não esquecesse o momento que eu estava passando... Como gosto de estudar e estava ultimamente estudando Antroposofia por minha conta, decidi procurar um grupo de estudos. Encontrei o grupo pelo facebook em uma página que trata do tema e ali, ainda em um primeiro contato me senti acolhida. Sei que não é coincidência, porque hoje consigo ter clareza do quanto o universo conspira a nosso favor quando realmente queremos algo. Encontrei um grupo humano, amoroso e profundamente acolhedor, com pessoas que com empatia compartilharam a minha dor... Estudar passou a ser um prazer, e estar com aquelas pessoas me fez um enorme bem...
Mas, ainda não era o suficiente... eu estava cheia de dor mas ao mesmo tempo cheia de amor... um amor que eu compartilhei com meus filhos... mas que não podia ficar aqui guardado no peito... Sou espírita e na casa que frequento busquei participar de um projeto como voluntária, ajudando famílias em situação de vulnerabilidade social. Eu sempre quis ser voluntária e sempre usei a desculpa do "não tenho tempo"... mas basta querer de verdade para podermos doar o nosso amor... pq não é o nosso tempo ou o nosso trabalho que doamos, é o nosso amor... e enquanto não sentimos esse amor, não podemos fazer o bem pelo próximo.

Com o meu coordenador do grupo de estudos, ainda participei de um seminário biográfico, onde tive a oportunidade de compartilhar a minha história de vida e a história de pessoas incríveis, guerreiras, vencedoras, humanas... E quando olhamos para nossa própria história e olhamos para a história do outro, com um olhar aberto e desprovido de julgamentos, a coisa muda... não sei dizer bem como é, mas daquele momento em diante, diversos sentimentos ruins que se acumularam naquele meu momento de dor, foram vividos e sentidos de uma maneira diferente. A minha história de vida me permitiu ver que eu não precisava ter medo ou vergonha da minha dor nem dos sentimentos que a acompanharam, como inveja, ansiedade, medo, fracasso... A minha história é linda, com luzes e sombras, cores e ausência de cores, forma e movimento... As minhas perdas me ensinaram muito a respeito de mim mesma, dos outros e da vida...
Mas, eu aprendi, vivi e senti tudo isso porque eu fiz essa escolha... e faço essa escolha todos os dias quando acordo... Assim como um alcoólatra ou um fumante em recuperação, que todos os dias precisam fazer a escolha por mais um dia limpo, eu faço a escolha por mais um dia vivido... e viver não significa não sentir dor, não sentir saudade... significa sentir tudo isso com amor, amor pela vida, amor por mim, amor pelos meus filhos perdidos, amor pelas pessoas que me amam... Escolho todos os dias me conectar com algo muito maior do que eu e com meu propósito de vida.

O que aprendi é que não podemos não sentir... esconder a dor não vai fazer com que ela passe... o luto precisa ser vivido e elaborado... e vivido sem vergonha, sem medo. Nós não conhecemos os nossos filhos, mas nós os sentimos, nós os vivemos e nós os amamos. Nossos filhos existiram sim e não importa o que a sociedade diga, nós fomos mães. E como mães sofremos a dor de perder os nossos filhos. Porque eles não precisam ter um corpo formado para que os amemos... Eles só precisam existir no nosso útero e no nosso coração.

Agora, que meu luto foi elaborado, faço aconselhamento genético com um geneticista me preparando para engravidar novamente. Meus exames ainda não estão todos prontos então comentarei sobre eles em um post futuro.



Um comentário:

  1. Lendo o texto pensei como nos homens entendemos o amor; Para mim o amor que sentimos por alguém é inicialmente algo solitário, de "fora para dentro" e que quando compartilhado pelo outro transforma nossa vida e pode construir tudo mais que tem valor !
    Mas se olharmos para a gestante e mulher, existe algo diferente, uma forma que acredito, por ser homem, que é única e difícil de ser entendida por nos.
    O amor de uma mãe pelo seu filho vem de "dentro para fora" ! E esta diferença que desde o primeiro momento da concepção é compartilhado de forma física e espiritual intensa pela mãe; Tudo que envolve o momento é muito mais forte e complexo, acredito que por isso ao perder um bebê perde-se mais que o filho que estava por vir mas também um pedacinho da alma que só entendemos quando buscamos ajuda e apoio.

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